quarta-feira, 18 de maio de 2011

As lágrimas do palhaço

Lágrimas do palhaço

Pelas andanças nesse mundão, pelo pouco que já vi, vi muito.

Praça. Parque. Rostos. Pinturas. Cores. Pipoca. Picolé. Tudo o que chama a atenção do “futuro da geração”. Futuro da geração? Será? Não foi isso que vi naquela tarde de domingo.

Com seu jeito menina,porém, mãos e traços de um adulto, ela me olhou. Curiosa me observava fazer a pintura sobre o rosto. Eu sorri e a chamei. Mais rápida do que calculei, ela já estava a me perguntar:

” – Você é palhaça?”


Sua pergunta foi uma ambiguidade, mas confesso que nenhuma das duas suposições sou. Respondi que não, mas que naquela tarde eu iria fazer uma apresentação, em que meu papel era de uma menina. Pedi que ficasse para assistir.

” – Ah tia, nem dá, minha vó tá lá no bar e nem vai esperar.”

Sem demora a palavra saiu da minha boca:

- Pede para ela esperar. Vai ser legal. A peça conta a história de alguém que morreu por amor a nós.
Ela me olhou, depois disfarçou, tentando entender o que significava amor. Sem esperar que algo fosse falar, perguntei:

- Você já ouviu falar de Jesus?

Mas percebi que o que era dúvda para ela do que seria amor, prevaleceu sobre quem era Jesus. Mas desta vez ela respondeu:

“- Não tia, só conheço …. ”

Nessa hora meus ouvidos falharam, não entendi o nome que pronunciou. Sem receio perguntei novamente:
- Hãm? Não entendi.

Ela se envergonhou, mas repetiu. Porém, agora quem tinha dúvidas era eu. Nunca ouvira falar de tal pessoa ( não me pergunte o nome, porque não sei nem como se escreve ). Fingi ter entendido, mas agora a quem eu deveria falar – Jesus -, deu lugar a quem eu queria saber – a pessoa que ela falou.

- Ele é legal? Perguntei.

“- Ah tia ele pega as mulheres de lá onde eu moro, amarra as mãos delas, pendura elas peladas, depois bate e corta elas.”

Talvez eu nunca pudesse imaginar tal cena. Aquilo que ela me disse grudou no meu pensamento e nunca mais saiu. Parei por um momento estagnada, perna bamba e coração apertado. ” Meu Deus, ela é uma criança de 7 anos.” Dei-lhe um abraço apertado e só consegui dizer:

- Não se esqueça que quem verdadeiramente te criou, lhe ama e nunca faria mau a você, Ele é Jesus.
Ao tentar entender o que eu disse, ela mudou de assunto:

“- Tia, paga um picolé pra mim…”

Comprei e a dei, era de cajá, o seu preferido. Pegou da minha mão com um sorriso que até então não tinha visto em seu rosto. Saiu correndo e antes que chegasse no bar, me deu um tchau. Não consegui entender o significado do que me falou. Pensei talvez que ela vivesse em um prostíbulo ou frequentasse algum tipo de ritual com sua avó. Só queria ter mais algum tempo com ela.

 A geração futura, onde estás? Das andanças, nunca imaginei que aquela menina fosse me marcar tanto. Desde então, o mundo, ou melhor o a bolha que eu criei para eu viver, estorou. O que me deixa triste é que a história dela é uma entre milhões. A humanidade tem se afastado cada vez mais de Deus. Criador e criatura não se assemelham mais.

Deus, onde estás? … Ele está no rosto dessa menina. Está nas quebradas. Está deitado nas ruas. Nas esquinhas esperando um programa. Nos becos abrindo uma pedra de crack. Está no menino que só vê esperança no saco com cola.

E nós, onde estamos?

Marina Kamei.

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